Tento abstrair-me. Visualmente é engraçado. Uma data de mulheres bonitas e novas a pavonearem-se. Dão nas vistas. A luz vermelha dá um toque de mistério, de sedução, é verdade. E continuo espantada por terem corpos tão bem delineados. Esperava travestis, mulheres mais velhas e degradadas, mulheres feias. Tento abstrair-me. Mas não consigo. Não entendo o que estão aquelas miúdas todas ali a fazer, a vender o corpo, a serem tocadas por estranhos e a executarem coisas íntimas com quem não conhecem. Pergunto-me se forem abordadas por um homem repugnante, de quem tenham nojo, se o deixam entrar. Gerem o seu próprio negócio e podem recusar quem quiserem ou são geridas e têm de receber todos? (devia ter feito o Red Light Tour e feito essas perguntas todas à ex-prostituta que faz os tours)
Passadas umas voltas vejo várias cortinas fechadas. Sinto-me estranha. À minha volta e dentro daquelas vitrines inúmeras miúdas fazem mil e uma coisas a homens velhos, novos, feios, bonitos, ricos, pobres, simpáticos, arrogantes, charmosos, pirosos, charrados, bêbados, sóbrios, etc...
Sim, já sei que é tudo legal e têm condições higiénicas bla bla bla. Já sei que a legalização da prostituição fez parte da emancipação das mulheres de lá. Fazem o que querem dos seus corpos, ganham imenso dinheiro com isso e passados uns tempos voltam para casa como e nada fosse, com a conta do banco recheada, casa nova, dívidas pagas, e prontas para um novo recomeço. Fazem o que querem e pagam impostos por isso.
Sim, não discordo da legalização (mas também não sei se concordo). Os homens (alguns, muitos, não sei) fazem-no de qualquer modo. Mas não me entra na cabeça o usar o corpo para ganhar dinheiro e sentirem-se livres por isso. Não estamos a falar de prostituição de luxo - posso estar muito errada e não conheço nada desse mundo -, mas penso que aí o nível é outro, e só está nele quem quer mesmo, quem goza a situação, quem tem maior controlo da sua vida. São situações privadas, discretas. Não são "carne fresca" em exposição em montras. Essa parte é tão, mas tão degradante. O que fazem aí miúdas? Querem ganhar uns trocos enquanto estudam? Vão trabalhar em part-time numa restaurante ou café, façam babysitting, etc etc. Porque estão ali? Porque gostam de sexo com qualquer homem? Porque têm imensas dívidas para pagar? Porque têm a família para ajudar? Porque querem ter roupas caras? Um bom carro? Uma boa casa?
Quanto ganham por noite? Gostam do que fazem ou sentem-se tão mal como eu me senti por vos ver aí? O que estão a fazer aí? Devia ter batido numa das vitrines e perguntado... Ficarei para sempre a questionar-me.
Nem tudo é "bonito". Algumas ruas perpendiculares revelam as tais mulheres "gastas" de que estava à espera. Corpos já disformes do tempo, vêm-se marcas, nódoas, peles descaídas. Numa outra rua vêem-se os tais travestis que já vira em documentários. Aqui o ar não é tão amigável e sedutor. Simplesmente esperam. Esperam pelo próximo. Noutra rua apenas mulheres mulatas ou pretas. As ruas dividem-se para todos os gostos. Mas de repente a sensação já não é tão juvenil ou erótica. Acho estas mulheres tristes. As outras da rua principal ainda fingem. Estas já não. Esperam por quem lhes irá pagar mais uma noite.
Não sei ainda o que pensar desta visão. Divido-me entre o choque de ver aquele "espetáculo" e a excitação de ver a rua das "prostitutas legais". Deixem-me digerir a coisa.
Sem comentários:
Enviar um comentário